Sempre que me recordo da nossa Missão ao Japão e à Korea existem duas lembranças muito significativas que me vêm à mente e que marcaram para sempre a minha vida profissional.
Uma delas é sobre o processo de gestão à vista, ferramenta de gestão na qual os indicadores são expostos à vista dos funcionários.
A outra lembrança diz respeito a um encontro que tivemos com Masaaki Imai, o homem que é considerado o guru do Kaizen e que difundiu pelo mundo essa filosofia que prega o processo de melhoria contínua.
Conforme a legenda da foto, eu fui ao Japão por conta da Busscar de Joinville-SC em missão de estudo e pesquisa junto com outros empresários brasileiros, os senhores Harold e Cláudio Nielson.
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Confesso que era grande a minha ansiedade para conhecer Masaaki Imai e ter a oportunidade de lhe fazer algumas perguntas, afinal de contas o nosso conhecimento sobre o tema vinha somente da literatura disponível na época. Eu já sabia que Kaizen significava melhoria contínua e que não se aplicava somente no ambiente do trabalho, mas se estendia também para a vida pessoal e social das pessoas, tendo como base os princípios socioculturais orientais. Eu também tinha consciência de que o Japão seria o berço natural para a adoção do Kaizen, muito diferente da realidade brasileira.
Partindo desse princípio, fiz a seguinte pergunta ao mestre Masaaki Imai: “estamos encantados com a melhoria contínua aqui no Japão! Tudo parece realmente estar em processo de evolução e temos uma ideia do quanto o aspecto cultural contribui para isso. Na próxima semana estaremos de volta ao Brasil e como o senhor sabe, não dispomos dessa base cultural. O que o senhor me aconselharia para implantar a melhoria contínua com sucesso?”
Do alto da sua simplicidade e sabedoria ele respondeu: “Vá para o Gemba! Nele você encontrará muitos problemas, mas pergunte sempre: Por quê? Por quê? Por quê? Por quê? Por quê?”.
Eu já tinha estudado que, para os japoneses, Gemba é o local de trabalho. É uma espécie de chão de fábrica, o lugar onde tudo acontece. Em um primeiro momento confesso que esperava algo mais do que a resposta do professor Masaaki. Na esperança de que ele me esclarecesse um pouco mais, solicitei que me explicasse à razão de tantos porquês.
Ele completou dizendo que os vários porquês Eram para que eu não me conformasse com qualquer resposta e que eu deveria investigar sempre com profundidade até encontrar a raiz dos problemas.
Confesso que por alguns anos fiquei remoendo as palavras do professor Masaaki. Muito mais tarde fui compreendendo que quando nos contentamos com qualquer resposta, corremos o risco de tratar de causas aparentes, mas não as causas que realmente impactam o problema. Compreendi também que enquanto a gente não elimina as causas significativas, gastamos recursos tratando somente dos efeitos e essas são tarefas que não agregam valor ao produto ou serviço. Nessas circunstâncias, as pessoas têm a ilusão de estar resolvendo os problemas, mas terminam por agregar ainda mais custos. Se o processo investigativo das verdadeiras causas não for muito bem feito, o retrabalho passa a fazer parte da rotina e a empresa acaba demorando muito tempo para conhecer a verdade dos fatos. Em grande medida, a boa gestão é um processo pela busca da verdade, já dizia René Descartes, em O Discurso do Método.
Por muito tempo fiz também muitas reflexões sobre o fato de o professor Masaaki ter sugerido que eu fosse pro Gemba. Pensava comigo: por que ele quer que eu aplique esses questionamentos no próprio chão de fábrica? A resposta foi aparecendo em gotas na medida em que estudava mais e mais e me convencia de que a administração é prática, como enfatizou ao longo de toda a vida o mais recente guru da gestão, o renomado Peter Drucker.
Qual é a consequência da adoção de um processo de melhoria contínua? A empresa termina por conseguir ganhos reais de produtividade e qualidade podendo chegar ao estado da arte no processo de gestão que na realidade não se limita só a produção, mas envolve todas as áreas da empresa.
O tempo foi me ensinando que a fixação do professor Masaaki pelo Gemba também tinha muito a ver com o fato de que precisávamos iniciar aqui no Brasil um processo de gestão onde os funcionários da linha de frente pudessem usar mais a cabeça, questionando e fazendo reflexões sobre as operações no próprio ambiente de trabalho. Isso era algo que o Japão já estava muito mais avançado. Eles já haviam rompido com modelo tradicional de produção em massa, em que poucos se ocupavam com o planejamento e os operários simplesmente usavam o corpo como um fator de produção. Professor Masaaki tinha a esperança de a gente pudesse ir para o Gemba exercendo mais empatia com o pessoal da linha de frente, que sabidamente sempre conheceu mais dos problemas do que a turma situada no topo superior da pirâmide hierárquica. Ele sabia que a turma da base até conhece muito dos problemas, mas é a turma de cima na escala hierárquica que tem poder para definir o sistema de trabalho.
Ao longo da vida, não canso de remexer e garimpar novas pérolas nas palavras de Masaaki Imai. Descobri que precisamos ir além do que é simplesmente dito. As palavras são sempre muito profundas e cheias de significado. Nós é que não as compreendemos de imediato. Percebo também que muitos empresários, discípulos de Peter Drucker, também necessitam fazer esse mesmo esforço para compreender ao longo do tempo o significado profundo de algumas frases que, a princípio, se apresentam despretensiosas. É por isso que eles são tão atuais e não contribuem simplesmente com informação nas nossas vidas. Contribuem para o nosso processo de formação. São palavras cheias de significado que carregam uma vida de reflexão e conhecimento precioso.